Entre os prédios de São Paulo: crise e sucesso
Por Beatriz Zolin, Maê Montagno, Maria Eduarda R. Arruda e Vinícius Buono
Os prédios de São Paulo preenchem a cidade. Mas ao andar entre os grandes edifícios, nem se imagina as histórias contidas nos tijolos das construções. Palco de crises, mudanças, massacres e resistências, edifícios carregados de memórias hoje passam despercebidos no caos paulistano.
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PRÉDIOS DE SÃO PAULO: SESC 24 DE MAIO
Um desses prédios, inicialmente uma loja de departamento chamada Mesbla, é hoje a unidade Sesc 24 de Maio. Criada em 1912, a filial da firma francesa durou 87 anos até a crise que decretou a sua falência. Acreditando que o País caminharia para uma hiperinflação no começo dos anos 1990, a diretoria da loja começou a estocar mercadorias. Com o surgimento do Plano Real e o fim da inflação, a Mesbla ficou com prejuízos acumulados. A concorrência da época foi um dos principais agravantes para a situação, mesmo com a tentativa frustrada do empresário Ricardo Mansur de arrematar a dívida. Por ter atitudes polêmicas em seus negócios, Mansur perdeu a credibilidade conquistada, fugiu para Londres e declarou falência da Mesbla em 1999.
Nesse período, a Prefeitura de São Paulo tinha planos para revitalizar a região do centro da cidade, onde se encontrava a Mesbla. Contudo, o Sesc 24 de Maio só foi inaugurado em 2017, já que o arquiteto Paulo Mendes da Rocha, responsável pelo projeto, enfrentou dificuldades em adequar o prédio às normas de segurança e padrões do Sesc.
O edifício abriga diversas áreas e atividades. Além de espaços destinados à leitura, internet, café, consultórios de odontologia e esporte, o edifício possui também uma piscina de 600 m² no terraço. Tal atração oferece prazerosos momentos de lazer a céu aberto para todo o público.
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PRÉDIOS DE SÃO PAULO: EDIFÍCIO MARTINELLI
Já o Edifício Martinelli, conhecido como o “bolo de noiva” de São Paulo, situado na Avenida São João, foi inaugurado em 1929. Fruto do projeto ambicioso de empresário Giuseppe Martinelli, o prédio é um dos cartões postais do centro e foi um grande marco no desenvolvimento urbano da cidade.
Crescido no Brasil, o italiano Giuseppe era também chamado de “comendador” por ser bem sucedido e ambicioso. Com o sonho de fazer o maior arranha-céu da América do Sul, ele projetou – em parceria com o arquiteto húngaro Vilmos Filinger – um edifício de inicialmente 12 andares, já um marco no visual paulistano.
No contexto da época, um arranha-céu seria uma imensa inovação, pois os prédios não ultrapassavam nem cinco metros de altura. A construção, mesmo começando em 1924, foi constantemente prolongada pela dificuldade de cumprir os prazos a tempo.
Mesmo considerada uma construção de risco, Giuseppe Martinelli procurava atender aos clamores da população, que estava entusiasmada em ver cada passo do arranha-céu. Depois de quatro anos, o planejamento de 12 andares passou para 20, algo jamais visto em São Paulo. Martinelli estava focado em sobressair suas próprias metas, e por isso não ficava de fora do projeto. Além de fiscalizar, ele ainda trabalhava como pedreiro e auxiliava todos os operários.
Quando a obra ultrapassou o 24° andar, a polêmica se instalou na cidade. A prefeitura de São Paulo interferiu, pois não sabia se prédios tão grandes harmonizariam com a cidade. O embate jurídico não impediu o proprietário de aumentar ainda mais os andares, que chegaram ao 30° piso com a adição da residência de sua família, no topo da torre. Adicionar à própria casa foi uma maneira de dizer à população, e até aos políticos, que o prédio não iria desabar.
Embora seja polêmico, o edifício Martinelli não se destacou apenas pela altura. No interior, o prédio era luxuoso e sofisticado, com acabamentos de mármore e materiais importados. Além disso, ele era conhecido por ser sede de partidos políticos (como o PRP – Partido Republicano Progressista), jornais, clubes (Palmeiras e Portuguesa), boates, hotéis e até mesmo utilizado como outdoor gigante.
Com o tamanho do prédio e a urbanização, problemas financeiros começaram a aparecer, e Giuseppe Martinelli acabou vendendo o edifício para o governo da Itália, em 1934. Como o Brasil apoiou aos Aliados na Segunda Guerra Mundial, o prédio acabou sendo confiscado pelo governo italiano, desencadeando uma crise.
O período pós-Guerra também foi de boom imobiliário, o que levou outros prédios ainda maiores a serem construídos, como o prédio do Banespa e do Banco do Brasil. Logo, o Martinelli não era mais novidade em meados de 1930 e foi se tornando obsoleto.
Anos depois, no início da década de 1970, ele entrou em decadência e se tornou um ambiente de risco no coração da cidade. Com ocupações ilegais e péssimas condições de vida, o Martinelli virou centro de prostituição e criminalidade, sendo palco de um dos crimes mais chocantes do período – o do menino Davilson, assassinado e jogado no poço do elevador.
Contudo, a decaída do Martinelli não durou por muito tempo. Em 1975, o prefeito Olavo Setúbal decidiu reformá-lo e desapropriou todo o prédio, incluindo com intervenção do exército. O edifício foi restaurado e tudo foi substituído, se tornando seguro e moderno. Em 1979, o prédio abriu as portas e foi ocupado pela Emurb (Empresa Municipal de Urbanização) e pela Cohab (Companhia Metropolitana de Habitação).
O mirante do Martinelli foi reaberto em abril de 2019 e transformado em observatório. Os horários de visitação são de segunda a sexta-feira (11h – 13h – 15h30 – 17h30) e sábado, domingos e feriados (11h – 12h – 13h – 14h30 – 16h30 – 17h30 – 18h30). As inscrições devem ser feitas 30 minutos antes de cada sessão, com grupos de até 15 pessoas.
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