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Cidade de São Paulo é a que mais sofre com obras paralisadas e escândalos

Entre os municípios paulistanos, a capital é a que mais concentra recursos não empenhados e investigações de improbidade responsáveis pelo embargo das obras

AQUI VAI MAIS UM FACTUAL 900: Esse vídeo é um compilado de reportagens atuais e antigas da mídia televisiva brasileira, com o objetivo de observar como diferentes canais ilustram esse tema: Obras Paradas.

Por Ana Clara Giovani, Carlos Senna, Caio Alfieri, Pedro Malaga e Vito D’Agostino

O estado de São Paulo possui, atualmente, 1677 obras inacabadas em situação de negligência, ou seja, atrasadas ou paralisadas. Desse número, há um total de 758 obras paralisadas. Destas, 176 trabalham com recursos próprios, sem a necessidade de injeção de verba pública de maneira direta. 

O número mostra-se muito inferior àquelas realizadas pelo poder público. As que possuem como fonte de recurso o convênio federal totalizam 338 obras, enquanto as realizadas com recursos estaduais somam 220. Somadas, são 558 as obras paralisadas que se utilizaram de verba dos cofres públicos, mais que o triplo daquelas provenientes de recursos privados. 

Para além do número de obras paralisadas, a média dos seus valores iniciais de contrato também se mostra discrepante. Enquanto as obras privadas tinham, em média, um valor inicial de contrato de R$53.372, as públicas são muito mais caras, num valor, em média, de R$2.049.395.

Fonte: TCE

Na cidade de São Paulo, o número de obras paradas é igual ao da somatória dos 15 municípios seguintes no ranking por tamanho da população.

A cidade de São Paulo é o que mais sofre com as obras paralisadas e escândalos no estado, de acordo com números agregados pelo Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE). Com o maior número de obras paralisadas ou atrasadas e o maior gasto com contratos entre as cidades paulistas, a capital foi impactada nos últimos anos por escândalos envolvendo construtoras integrantes de consórcios vencedores de licitações para obras principalmente na área do transporte público.

Na cidade de São Paulo, o número de obras paradas é igual ao da somatória dos 15 municípios seguintes no ranking por tamanho da população. São 99 contratos firmados, que criam na população expectativas de melhorias em diversos setores, mas que não estão ainda oferecendo resultados à população. Dessas quase 100 obras, 50 estão paralisadas e sem expectativa de serem completadas. O montante da soma do valor inicial dos contratos ultrapassa os R$41 bilhões. Se levarmos em conta apenas as obras paralisadas, são R$33 bilhões. 

Não é apenas nos números totais que a capital lidera, no entanto. Também é a localidade com os contratos iniciais de maior valor médio, ultrapassando os R$422 milhões. E é a cidade onde o cidadão gasta mais com essas obras. O gasto per capita com estes contratos é mais de 5 vezes o valor gasto pelo cidadão de São Bernardo do Campo, segunda colocada no estado por este critério.

Também de acordo com o TCE, o município de São Paulo já gastou, de fato, o total de R$8.541.421.685,45 com 81 das 99 obras inacabadas, onde cerca de 69% desses gastos saíram das contas da prefeitura, 14% são recursos estaduais e 1% são recursos federais. Esse valor é mais de 10 vezes maior que o dos contratos iniciais de obras de Guarulhos. Os gastos com 18 obras não foram informados ao Tribunal de Contas.

O governador Geraldo Alckmin durante início das obras de escavação do VSE Tietê (poço de ventilação) da Linha 6-Laranja do Metrô, que ligará a região noroeste da cidade ao centro (Brasilândia – São Joaquim). Data: 13/04/2015. Local: São Paulo/SP. Foto: Edson Lopes Jr/A2AD

. Linha Laranja – Sem informação e muitos gastos

Uma dessas obras sem informações é a da Linha Laranja do metrô paulistano, que supostamente ligará o Centro da capital à Brasilândia e à Freguesia do Ò, sob responsabilidade da concessionária Move São Paulo (formada pelas empresas Odebrecht, Queiroz Galvão e UTC). O contrato entre o conglomerado e a prefeitura ultrapassa os R$23 bilhões e representa mais da metade do valor dos contratos para obras paradas. Segundo dados, por nota do Governo, foram gastos até o momento R$ 694 milhões em obras e R$ 984 milhões para pagamento das desapropriações. O custo total da obra está estimado em R$ 9 bilhões.

O governo do estado de São Paulo, anunciou no dia 10 de agosto de 2019, decreto estendendo até dia 11 de novembro o prazo para decretar caducidade da construção da Linha 6-Laranja do Metrô. O prazo atual tinha validade até 13 de agosto.

As obras encontram-se paralisadas desde 2016, quando o Consórcio Move São Paulo, desistiu do empreendimento por falta de crédito, situação decorrente do envolvimento das empresas UTC, Odebrecht e Queiroz Galvão, formadoras do consórcio, com a operação Lava Jato. A responsabilidade da vigilância dos canteiros de obras e dos imóveis desapropriados, que encontram-se abandonados, ainda é do consórcio. Em 2017, executivos da Odebrecht, em delação premiada, informaram a Polícia Federal e o Ministério Público de que os contratos da Linha Laranja haviam sido usados para financiar o esquema de propinas e caixa 2 mantido pela empresa.

A gestão João Doria, tem agora até novembro para fechar acordos com novas empresas interessadas em comprar a parte das construtoras no consórcio e dar continuidade nas obras. A decisão de prorrogação do prazo foi tomada para ganhar tempo, pois segundo o governo, três empresas internacionais estão interessadas. Caso nenhuma empresa assuma o contrato, será necessária a realização de uma nova licitação, atrasando ainda mais a entrega da linha.

O maior gasto efetivo já feito em uma única obra parada no momento foram os mais de R$2 bilhões investidos no trecho leste do monotrilho

Com quinze quilômetros de extensão, a linha teria início em São Joaquim, linha 1-Azul, na Liberdade, e iria até Brasilândia, Zona Norte, atendendo aos bairros Bela Vista, Higienópolis, Pacaembu, Perdizes, Pompeia e Freguesia do Ó.

Obras do Rodoanel Norte – Fonte: Flickr – Governo do Estado de São Paulo

. Dersa – Ameaçada de extinção e incerteza dos contratos

Outra empresa implicada em corrupção em licitações e contratos públicos é a própria Desenvolvimento Rodoviário S/A (Dersa), a estatal estadual responsável por obras no sistema de rodovias de São Paulo, embora a maioria das rodovias estaduais seja atualmente administrada por concessionárias. O ex-diretor da empresa, Paulo Vieira de Souza, Paulo Preto, é um dos pivôs de diversas investigações.

Neste domingo (18/08), o governador João Dória enviou à Assembléia Legislativa de São Paulo um Projeto de Lei que extingue a estatal, segundo essa alegação. Os ativos da empresa seriam privatizados para sanar dívidas. Mas não fica claro o destino dos contratos no valor de mais de R$1,8 bilhão relativos a obras paralisadas no município de São Paulo.

O maior gasto efetivo já feito em uma única obra parada no momento foram os mais de R$2 bilhões investidos no trecho leste do monotrilho, obra faraônica do governo do estado que não parece ter nenhum horizonte para ser terminada.

Outra obra com gastos altos e, digamos, interessantes, é a obra do chamado Rodoanel Norte. Abandonada na divisa entre Guarulhos e a capital, a obra estava prevista para custar R$4,3 bilhões e já ultrapassou os R$6,3 bilhões. Na parte que cabe ao município de São Paulo, um único contrato com a Acciona Construcción, empresa espanhola, com valor inicial de R$788 milhões, já consumiu mais de R$830 milhões.

Do total de obras paralisadas, podemos apontar o Complexo Hospitalar Cotoxó, na Pompeia, Zona Oeste de São Paulo, como um exemplo típico. O contrato inicial previa investimento público de R$ 63,4 milhões de para cumprir o prazo de conclusão da obra em 3 de julho de 2014. O projeto, que ainda não foi concluído, já tirou dos cofres do estado R$ 24,3 milhões. A nova previsão é finalizar os trabalhos no segundo semestre de 2020, seis anos depois do prazo previsto anteriormente. O Governo do Estado de São Paulo afirma que a “execução (da obra) foi impactada pela necessidade de readequação ambiental do projeto em respeito ao entorno dela, de alta densidade demográfica”. O governador João Doria, do PSDB, atribui os atrasos na entrega das obras apontadas pelo TCE ao governo anterior. Segundo o tucano, “a atual gestão herdou em janeiro de 2019 ao menos 175 obras paralisadas em todo o estado, deixando um passivo de R$ 10 bilhões aos cofres públicos. O governo segue empreendendo todos os esforços para a retomada dos trabalhos”.

Trazendo dados sobre as obras paradas e atrasadas no Brasil, no estado e na cidade de São Paulo, Tiago Tortella, Julia Palmieri e Angela Caritá comentam um pouco mais sobre o assunto em um podcast explicativo do projeto experimental Factual 900, da Faculdade Cásper Líbero.

Os dados e informações mencionados foram retirados do painel feito pelo Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, divulgado em abril 2019; do site Viva Tatuapé e de matéria do site 32xsp.

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